Decidi quebrar o gelo, hoje vou falar do que é sair da zona
de conforto.
Os últimos dois anos foram os mais difíceis da minha vida.
Com tudo de mau a que tive “direito”. Como perfeccionista e pessoa exigente que
sou, o resultado podia ter sido ainda mais desastroso. Graças à consciência que
tenho e à coragem de saber pedir ajuda expondo todas as minhas fragilidades, o
processo foi longo e duro mas a tempestade acalmou. O declínio acentuado de uma
queda que parecia não ter fim começou há um ano. Com ele vieram as crises de
ansiedade características de quem tem a raiva e a insatisfação nos picos mais
altos do Everest. Viver tornou-se penoso. Acorda todos os dias e saber que
tinha um dia para enfrentar era um terror. O único momento em que sentia
algum alívio era aquele final de dia só para mim. Passadas algumas semanas, já
nem esse momento eu tive.
Pedi ajuda, chorei. Chorei muito ao ponto de achar que ia
sufocar com tanto soluço. Liguei vezes sem conta a pedir ajuda, a achar que ia
morrer a qualquer instante e, pior do que tudo, cheguei ao ponto em que morrer
me pareceu uma boa saída. Não quis suicidar-me, nem forças para isso me
restavam. No entanto morrer pareceu-me a única solução para calar esta raiva e
insatisfação que não me abandonava.
Tive várias mãos e ombros disponíveis para ajudar.
Felizmente ainda há profissionais excelentes e pessoas com quem tenho a sorte,
imensa sorte, de poder contar.
Desci ao inferno e hoje quando olho para trás, tenho ainda
mais consciência disso. Perdi a esperança, convenci-me que não merecia nada
melhor do que aquilo que a vida me dava naquele momento.
Dói tanto ver a forma como me maltratei ao convencer-me
disso. Dói ver a angústia que o meu peito calava e a impotência estampada nos
olhos de quem gostava de mim. A única que podia mudar o rumo da história, da
minha história, era eu. E eu não tinha forças, nem calma, nem visão para tal.
Nos raros momentos em que me permitia sonhar via uma Sandra
mais consciente e livre. Não me parecia possível. Com o tempo e muita ajuda
profissional, a Sandra acabou por voltar: já voltava a acreditar que havia
outras possibilidades. Passei meses a ponderar o rumo a seguir. Estes processos
envolvem muitas tentativas falhadas, muita persistência, resiliência e
determinação.
Reformulei a minha meta e fui à gaveta do coração buscar os
objectivos que julguei perdidos. Às vezes dói tanto saber o quanto os
aprisionei quando mais falta me faziam. Passei outros tantos meses a traçar um
plano e a implementá-lo. Trabalhei muito em mim, nos meus materiais. Pesquisei
afincadamente. E finalmente arregacei mangas. Atirei muitas balas aos alvos que
pretendia. Uns falhei redondamente mas depois fui aperfeiçoando a técnica. E
desde que as balas começaram a sair da minha arma, já não mais consegui parar.
A cada dia a vontade de alcançar, de melhorar, de evoluir me preenchia cada vez
mais. Acordava com energia, com certezas, com mais serenidade. Voltava a ter
esperança e com ela veio a determinação. Voltei a maquilhar-me, a usar sapatos
de salto alto e a permitir que o meu coração ficasse imensamente feliz com cada
pedacinho das minhas conquistas.
A dada altura já não tinha mãos a medir e fui testada ao
máximo. Dei um murro na mesa sem ter noção do que vinha a seguir; apenas sabia
que não podia continuar na situação que me encontrava. Acredito que perceber os
nossos limites e ter a coragem de saír da zona de conforto são atitudes que nos
salvam da vida medíocre em que eu estava mergulhada. Foram meses de
planeamento, de aperfeiçoamento. De avanços, dúvidas e retrocessos mas a
esperança tomou conta do leme do meu navio.
Quando as portas se abriram, a primeira coisa que fiz foi
pedir desculpa a mim própria pelo mal que me causei ao permitir que os
obstáculos diários tivessem aniquilado a minha esperança, o meu sonho e tudo
aquilo que de bom me caracteriza. Olhar para esses tempos passados permitiu-me
entender o que na altura não enxergava: eu não podia ser tão “mázinha” comigo.
Mas fui. Naqueles momentos fui a minha pior inimiga. E ainda não consigo
entender como cheguei àquele ponto. Foi tudo tão difícil…
A segunda coisa que fiz foi agradecer a quem me ajudou a
manter o meu barco à superfície evitando que naufragasse. Partilhei vitórias:
pequeninas e maiores. Partilhei projectos, desejos e ambições. Alegrias, medos,
inseguranças. Estava agora uma mulher mais agitada mas também mais feliz.
A terceira coisa que fiz foi prometer a mim própria que não
voltarei a permitir que nada nem ninguém me roube a serenidade. Jurei falar
mais, calar menos. Jurei pôr os meus sonhos acima das minhas aflições.
Todos nós sabemos que o mundo, felizmente, não acaba aqui
pois ainda tenho muitos altos e baixos para viver. Mas aprendi que o medo só
nos destrói, mas quando o vencemos ele torna-nos mais fortes, mais ágeis, mais
capazes. Sair da zona de conforto não é fácil mas a vida não reside ali; a vida
está onde a magia acontece. Que seja docinho o que vier a caminho.