A minha sorte combate a ansiedade durante todo o dia: desde o momento que abrimos olhos até ao momento em que sinto o conforto da minha cama e sei que estou no meu porto seguro.
A minha sorte continua a pedir-me concentração para trabalhar mesmo quando me sinto mal. Mesmo quando me trocam as voltas, me puxam o tapete, me menosprezam.
A minha sorte vai às compras no fim do trabalho porque nao depende de ninguém. Vai ao médico. À farmácia. Com ainda mais sorte, vai caminhar ao som da natureza.
A minha sorte também vai ao ginásio com algumas palavras, frases ou expressões faciais a ecoarem em loop na sua cabeça. Vai, dá o seu melhor, sente que pode "desabar" com tanto esforço, mas vai. E volta do ginásio com os músculos mais pesados do que quando entrou.
A minha sorte reconhece os seus limites: sabe que engordou por falta de saúde e sabe que está a emagrecer pelos mesmos motivos.
A minha sorte passa dias a fio a trabalhar em algo que é destruído por um comentário. Que é desvalorizado por muitos, reconhecido por alguns.
A minha sorte passa sábados inteiros em frente ao computador para tentar melhorar o que está feito ou a criar algo que à partida, nunca sairá do papel. Mesmo assim não desiste.
A minha sorte também se cansa, também desanima. Também chora. Chora muito: de alegria quando reconhecem o meu esforço; de tristeza quando sente injustiças; de medo sempre que surgem mais mudanças; de revolta quando o tempo não estica.
A minha sorte sai a correr do trabalho e vai para uma sala de formação para evoluir, trabalhar competências, ser um pouco melhor.
A minha sorte adora ver o pôr do sol na varanda do quarto mas nem sempre chega a tempo. A minha sorte ainda vai para casa preparar marmitas para o dia seguinte; revê os pontos que devem ser prioridade no dia de "amanhã" (mesmo sabendo que num estalar de dedos, tudo se altera).
A minha sorte tenta desligar do mundo real pelas 23h30 mas raramente consegue.
A minha sorte é saber que o dia seguinte começa cedo, com muitos desafios e muito para viver e aproveitar.
Por isso, da próxima vez que quiserem encher o peito para me criticar, lembrem-se da minha (real) sorte e percebam que vidas perfeitas não existem. Existem pessoas que lutam pela sua sorte todos os dias, reconhecendo as suas fragilidades, enfrentando os dissabores da melhor forma que conseguem e, pelo caminho, ainda dispensam energia a quem mais precisa dela.
Sorte a minha não precisar de quem me acusa de ter sorte; a minha sorte não tem tempo para isso. Como podem ver, ela acorda cedo mas tem uma vida tão ocupada quanto (im)perfeita.
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